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 Por Cesar Oliveira Janoti*

Em vigor a partir de 30.04.2019, o renovado estatuto deontológico tende a avançar da moral estritamente paternalista ao modelo de maior respeito à autonomia da vontade.

Fruto de quase três anos de intensas discussões, o Novo Código de Ética Médica buscou adequar o exercício da Medicina às questões éticas atuais decorrentes principalmente das mudanças da sociedade, da compreensão sobre a vida e a morte, da evolução tecnológica e da mercantilização e judicialização da saúde, aproximando-se de padrões internacionais e de novas leis pátrias, sempre com o objetivo precípuo de atribuir equilíbrio e segurança à relação médico-paciente.


Dentre as principais inovações, acrescentou-se ao rol de princípios fundamentais a necessidade do exercício da Medicina mediante a utilização dos melhores “meios técnicos e científicos disponíveis” (capítulo I, item XXVI), o que não se confunde com o imperativo utópico de emprego dos melhores métodos e procedimentos existentes, e, por conseguinte, norteia o atuar médico dentro de balizas circunstanciais plausíveis.


Em relação aos direitos, reforçou-se o poderio do Médico de abster-se do exercício de sua profissão em instituição pública ou privada com condições indignas de trabalho ou prejudiciais à própria saúde ou a do paciente e demais profissionais, devendo, para tanto, noticiar a justificativa da recusa e indicar as falhas em normas, contratos e práticas internas ao diretor técnico, ao Conselho Regional de Medicina de sua jurisdição e à Comissão de Ética da instituição, quando houver (capítulo II, itens III e IV).


Ainda no tocante aos direitos, assegurou-se ao “Médico com deficiência ou com doença, nos limites de suas capacidades e da segurança dos pacientes”, o exercício da profissão sem qualquer discriminação (capítulo II, item XI), visando a sua inclusão no mercado de trabalho, em plena consonância com a Convenção da ONU sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (2008) e o Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei n.º 13.146/2015).


No que se refere a temas sensíveis como a utilização de mídias sociais pelo Médico e o exercício da telemedicina, a nova codificação admite o uso de tais meios, porém não apresenta regulamentação sobre a matéria, postergando-a para futuras normas a serem discutidas e elaboradas pelo próprio Conselho Federal de Medicina (capítulo V, art. 37), mantendo, ao menos por enquanto, as incertezas e inquietações que permeiam as polêmicas recentes sobre o assunto.


Já na relação médico-paciente, um avanço importante diz respeito ao maior reconhecimento da autonomia da vontade do paciente, que poderá decidir livremente sobre a execução de práticas diagnósticas ou terapêuticas. Permanece obscuro, todavia, a exceção relativa à dispensa de consentimento do paciente quando do risco iminente de morte (capítulo V, art. 31), fato este que, segundo inúmeros normativos internacionais e decisões judiciais pátrias, violaria a dignidade da pessoa humana sob a perspectiva de que cabe exclusivamente ao paciente ou seus representantes deliberar sobre a própria vida e morte.


No mais, permanecem incólumes as restrições sobre publicidade e relações comerciais com laboratórios farmacêuticos e outros players do ambiente médico, a vedação de receitar e atestar de forma ilegível ou secreta, e o direito de objeção de consciência do médico, dentre outros pontos relevantes.


Isto posto, há que se ressaltar as evoluções trazidas pelo Novo Código, resultantes da atualização deontológica imprescindível sobretudo à valorização da autonomia da vontade e ao arrefecimento do rígido paternalismo hipocrático tradicionalmente orientador da relação médico-paciente, sendo certo, contudo, que o progresso regulatório deve ser contínuo para que seja oferecido aos Médicos as ferramentas normativas necessárias ao enfrentamento dos sensíveis embates éticos e morais que diariamente lhes são apresentados.

*Advogado, Mestrando em Ciências Jurídicas na Universidade Autónoma de Lisboa, Professor Convidado da Universidade Presbiteriana Mackenzie e da Escola Paulista de Ciências Médicas.